
O que são cromossomos?
12 de maio de 2025
Fatores de risco para o câncer: O papel do fumo
12 de junho de 2025É fato que alguns fatores de risco como o fumo, o álcool e a obesidade podem aumentar o risco de câncer, como já mostrado por inúmeros estudos científicos nas últimas décadas. Por isso, nessa série, vamos explorar a fundo o papel de cada um desses fatores no desenvolvimento do câncer.
Álcool e câncer
Estima-se que, apenas no ano de 2016, o consumo de bebidas alcoólicas tenha sido responsável por 3 milhões de mortes e causado mais de 5% de todas as doenças e acidentes no mundo. O consumo de álcool é responsável por 4% dos casos de câncer, sendo os principais órgãos acometidos o esôfago, fígado, mama, intestino (colorretal), boca, faringe e laringe.
Quando o álcool é ingerido, ele é metabolizado pelo organismo, e outra substância é formada: o acetaldeído. O acetaldeído é uma substância genotóxica, ou seja, ela interage com o DNA das células, causando mutações, quebras e outros danos estruturais. Essa substância também pode interagir com outras proteínas na célula, levando ao estresse oxidativo, que impede a reparação do DNA, por exemplo. O consumo de álcool também leva ao processo de inflamação do organismo, à redução da imunidade e interfere com alguns hormônios, levando a um desequilíbrio metabólico, que proporciona o ambiente ideal para a instalação de várias doenças, entre elas a cirrose e o câncer.
Consumo de álcool e câncer: não há dose segura
Recentemente, o Cirurgião Geral dos Estados-Unidos (EUA), que é o responsável do governo federal do país por comunicar questões relativas à saúde pública, emitiu uma recomendação para profissionais da área da saúde e também para o público geral, alertando para os riscos da ingestão de bebidas alcoólicas no desenvolvimento do câncer. O documento destaca que a relação direta entre o consumo de álcool e o câncer foi estabelecida no final dos anos 1980, e as evidências dessa ligação se fortaleceram ao longo do tempo.Além disso, a Organização Mundial da Saúde (OMS) já havia declarado em 2023, em publicação na revista científica The Lancet Public Health, que não existe um nível seguro de consumo de álcool para a saúde.
Recomendações anteriores indicavam que um consumo semanal seguro era de até 21 doses para homens e 14 doses para mulheres (sendo 1 dose correspondente a 10g de álcool puro, ou seja, 250 ml de cerveja, 100 ml de vinho ou 30 ml de destilados, aproximadamente). Contudo, várias meta-análises recentes mostraram que 1 dose de álcool por dia já aumenta consideravelmente o risco para diversos tipos de câncer (meta-análise é um tipo de estudo que analisa estatisticamente o resultado de outros estudos científicos sobre um determinado tema).
Em 2020, foram contabilizados 741.300 casos de câncer no mundo atribuídos ao álcool, e o uso dessa substância está associado a uma redução média de 15 anos na expectativa de vida. Nas mulheres, o problema é ainda mais grave, pois o consumo inferior a uma dose por semana já eleva o risco de câncer para 16,5%, contra 10% nos homens.
Câncer: uma doença multifatorial
A recomendação do Cirurgião Geral dos EUA ressalta, ainda, que os riscos mencionados são médias baseadas nas populações estudadas, e que o risco individual de desenvolver câncer relacionado ao álcool varia conforme uma complexa interação de fatores biológicos (como genética) e ambientais (como exposição a outros carcinógenos). O uso de álcool concomitante ao fumo aumenta ainda mais a absorção das substâncias contidas no cigarro, por exemplo. Além disso, fatores sociais e econômicos, incluindo normas sociais, pressão do grupo e publicidade, influenciam o nível de consumo e o risco associado.
A Dra. Carina Ferreira-Borges, assessora regional da OMS para assuntos relacionados ao álcool e drogas ilícitas na Europa, afirma que “quanto mais você bebe, mais prejudicial é – ou, em outras palavras, quanto menos você bebe, mais seguro é”, e destaca que o fato de o álcool causar câncer ainda não é amplamente conhecido pela população na maioria dos países. Menos da metade dos adultos nos EUA associa o álcool ao risco de câncer, e esse percentual pode ser ainda menor em países em desenvolvimento, como o Brasil. Como vimos acima, os mecanismos que aumentam o risco de câncer pelo álcool envolvem danos ao DNA e às células, aumento da inflamação corporal, alterações hormonais e maior absorção de carcinógenos, sendo o risco proporcional à dose consumida.
O Dr. Jürgen Rehm, membro do Conselho consultivo de doenças não-transmissíveis da OMS e cientista sênior do Centro de dependências e saúde mental, em Toronto, Canadá, destaca: “Os possíveis efeitos protetores do consumo de álcool sugeridos por alguns estudos estão fortemente ligados aos grupos de comparação escolhidos e aos métodos estatísticos utilizados, e podem não considerar outros fatores relevantes.” Essa fala busca desmistificar um argumento tão enraizado na sociedade de que uma dose de vinho por dia, por exemplo, pode ter um efeito benéfico contra doenças cardiovasculares, o que não tem se confirmado nos últimos estudos realizados sobre o tema.
Apesar do câncer ser uma doença multifatorial, causada por vários fatores como genética, idade, hereditariedade, entre outros, e não somente por substâncias consumidas, é importante notar que o álcool tem grande potencial para levar ao desenvolvimento de diversos tipos de câncer. Para enfrentar o desafio de diminuir os casos da doença relacionados ao consumo de bebidas alcoólicas, são propostas medidas como a inclusão de rótulos alertando sobre o risco de câncer, promoção da vigilância em saúde pelos órgãos competentes, reforço das boas práticas clínicas e educação da população sobre as novas recomendações, reconhecendo que se trata de um enorme desafio para a saúde pública.
Estamos aqui para informar, oferecendo as melhores evidências científicas disponíveis a você. Compartilhe este conteúdo para que essa informação alcance o maior número possível de pessoas. Junte-se a nós e contribua para promover a saúde e o bem-estar de todos!
Referências
- WHO. Global status report on alcohol and health 2018. World Health Organization. 2019 Feb 14. https://apps.who.int/iris/handle/10665/274603
- Rumgay H, Murphy N, Ferrari P, Soerjomataram I. Alcohol and Cancer: Epidemiology and Biological Mechanisms. Nutrients. 2021 Sep 11;13(9):3173. doi: 10.3390/nu13093173
- Alcohol and Cancer Risk: The U.S. Surgeon General’s Advisory, 2025. https://www.hhs.gov/sites/default/files/oash-alcohol-cancer-risk.pdf
- Health and cancer risks associated with low levels of alcohol consumption. Anderson, Benjamin O et al. The Lancet Public Health, Volume 8, Issue 1, e6 – e7
- CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool – Definição de dose padrão. https://cisa.org.br/sua-saude/informativos/artigo/item/48-definicao-de-dose-padrao
- The evidence base for alcohol guidelines, 2011. https://publications.parliament.uk/pa/cm201012/cmselect/cmsctech/writev/1536/ag22.htm
- Alcohol and Cancer: Epidemiology and Biological Mechanisms. 2021. doi:10.3390/nu13093173
- “Alcohol-Related Disease Impact (ARDI) Application.” Centers for Disease Control and Prevention, 2024. https://nccd.cdc.gov/DPH_ARDI
- Alcohol consumption, drinking patterns and cancer incidence in an Australian cohort of 226,162 participants aged 45 years and over, 2021. https://doi.org/10.1038/s41416-020-01101-2
- No level of alcohol consumption is safe for our health, 2023. https://www.who.int/europe/news/item/04-01-2023-no-level-of-alcohol-consumption-is-safe-for-our-health
- 2019 AICR Cancer Risk Awareness Survey. https://www.aicr.org/assets/can-prevent/docs/2019-Survey.pdf